Se são conjuntos não vazios, um subconjunto é uma relação -ária. No caso de dois conjuntos, digamos e , temos uma relação binária de para ou, simplesmente, dizemos relação. Uma relação binária sobre é uma relação binária de para .
Notação: Escrevemos com o significado de . Escrevemos com o significado de .
São exemplos de relações (binárias)
- é uma relação binária e , mas usamos .
- é uma relação binária e , mas usamos .
- é uma relação binária e , mas usamos .
6.1. Composição e inversa
Assim como as funções, as relações podem ser compostas. Dadas as relações e definimos
pela regra se, e somente se, existe tal que e . Em notação infixa
Não é difícil ver que a composição ordinária de funções é um caso especial de composição de relação.
Por exemplo, considere as relações
A composição delas é
As relações também têm inversa
Ao contrário das funções, toda relação tem uma inversa.
Por exemplo, tome e
A relação inversa é
Ademais
Exercício 25 Qual é inversa da relação sobre ?
Notação: Para uma relação genérica, usamos símbolos como , , , ao invés de .
6.2. Classificação de relações
Uma relação binária sobre um conjunto pode ou não ter uma das seguintes propriedades:
- reflexiva para todo , ;
- irreflexiva para todo , ;
- simétrica para todo , para todo , se então ;
- antissimétrica para todo , para todo , se e então ;
- transitiva para todo , para todo , para todo , se e então .
Por exemplo, em a relação se, e só se, é reflexiva, simétrica e transitiva.
Uma relação pode ser simétrica e antissimétrica ao mesmo tempo, ou pode não ser nem simétrica nem antissimétrica. Uma relação pode ser nem reflexiva e nem irreflexiva porém, se o conjunto não é vazio, uma relação não pode ser ao mesmo tempo reflexiva e irreflexiva sobre .
Por exemplo, as relações sobre
- é reflexiva.
- é simétrica.
- é reflexiva e simétrica.
- é irreflexiva, antissimétrica e transitiva.
- é reflexiva, antissimétrica e transitiva.
- é irreflexiva, antissimétrica e transitiva.
Exercício 26 A seguir, considere e e classifique, quanto as propriedades acima, as relações
- .
- .
- .
- .
- .
6.3. Relações de equivalência
Uma relação é de equivalência se for reflexiva, simétrica e transitiva.
São exemplos de relações de equivalência
- é uma relação de equivalência em .
- não é uma relação de equivalência em .
- Se e são triângulos no plano e se os triângulos são semelhantes, então é relação de equivalência sobre o conjunto de todos os triângulos no plano.
- Semelhança de matriz é uma relação de equivalência sobre o conjuntos de todas as matrizes quadradas de ordem de números reais.
- é a relação dada pelos pares de inteiros que deixam o mesmo resto quando divididos por , é de equivalência.
- não é relação de equivalência sobre o conjunto das partes de .
Partição de um conjunto
O conjunto é uma partição do conjunto se seus elementos são subconjuntos não-vazio de , disjuntos dois-a-dois e a união deles é , isto é,
- (a) para todo , e ;
- (b) para todos , , ;
- (c) .
Por exemplo, sejam , e subconjuntos de definidos por
é uma partição de .
Teorema 34 Se é uma {partição} do conjunto , então a relação binária sobre dada por se, e só se, existe tal que é uma relação de equivalência.
Demonstração: Sejam , e como dados no enunciado.
A relação é reflexiva pois para todo existe um tal que pelo item (c) da definição de partição.
A relação é simétrica pois para todos se existe um tal que então .
A relação é transisiva pois para todos se existe um tal que e existe um tal que então, como , temos pelo item (b) da definição de partição.
No exemplo acima é a partição de dada pelos restas da divisão por . Definimos sobre por
isto é, e estão na relação se deixam o mesmo resto quando divididos por .
Classes de equivalência
Seja uma relação de equivalência sobre o conjunto e
é o subconjunto de formado por todos os elementos equivalentes a , chamado de classe de equivalência de . O elemento dentro dos colchetes é chamado de representante da classe.
Por transitividade, qualquer elemento da classe pode ser seu representante. Seja com . Para todo vale , portanto, , logo . Reciprocamente, se então , por argumento análogo. Assim . Também, se então de temos , portanto . Com isso provamos
O que podemos dizer no caso ? Imediatamente, por (33) que . Para qualquer , se então , caso contrário teríamos uma contradição pela transitividade, de modo que .
Concluindo, dos parágrafos precedentes temos que para as classes de equivalência vale um dos casos: para quaisquer
- , ou
- .
O conjunto quociente de pela relação de equivalência é o conjunto das classes de equivalência da relação
Já provamos, no teorema 34, que um partição do conjunto não vazio define uma relação de equivalência. A recíproca também vale, uma relação de equivalência sobre define uma partição desse conjunto.
Teorema 35 Se é uma relação de equivalência sobre o conjunto então é uma partição de .
Demonstração: Exercício.
Por exemplo, no caso de exemplo dos restos de divisão por
Observemos que .
6.6. Relações de ordem
Uma relação sobre um conjuto é uma relação de ordem se essa for
- reflexiva,
- antissimétrica e
- transitiva.
Exemplo: é uma relação de ordem sobre e é uma relação de ordem sobre .
Há uma diferença importante entre as duas relações de ordem do exemplo anterior, na primeira, , pode haver elementos incomparáveis, por exemplo, os conjuntos e são incomparáveis
enquanto que quaisquer dois números inteiros e são comparáveis
Se em há elementos incomparáveis sob a relação de ordem então
ou, e conjunto parcialmente ordenado por Caso contrário
ou, é conjunto totalmente ordenado por .
Exemplo: , e são ordens parciais, somente é total.
Máximos e mínimos
Definição 19 Em temos que é um elemento minimal se, e só se, para todo , implica que .
Em temos que é um elemento maximal de se para todo , implica que .
Um conjunto parcialmente ordenado pode ter qualquer número de elementos minimais: os números inteiros não têm mínimo, os naturais têm um mínimo e um conjunto com elementos nenhum dos quais são comparáveis entre si tem mínimos. As afirmações análogas para maximal também valem.
Exemplo: Sejam e tomemos em a relação de ordem dada por . O número , por exemplo, é um elemento minimal de , pois não existe nenhum par , , na relação. Os elementos minimais são , e .
Exemplo: Tomemos e a relação “divide”. O número não é minimal pois, por exemplo, e . O número é minimal pois não existe nenhum par com em (a única possibilidade seria o que não está no conjunto). Note que os elementos minimais de são os números primos.
Quando é um conjunto de conjuntos e a relação de ordem é , um elemento minimal de é um conjunto que não contém propriamente nenhum outro elemento de . Por exemplo, se então não é minimal (contém propriamente ). São os elementos minimais , e . O elemento não é maximal (por que?). Os elementos maximais de são , e .
Definição 20 Se um elemento satisfaz para todo , então é um mínimo de .
Se um elemento satisfaz para todo , então é um máximo de .
Um conjunto parcialmente ordenado tem no máximo um mínimo. Por exemplo, nos naturais é mínimo. Também pode não ter um mínimo como os inteiros negativos ou pode não ter mínimo porque tem mais de um elemento minimal. As afirmações análogas para máximo também valem.
Exemplo: Seja e seja a relação (menor ou igual) sobre . O inteiro é um mínimo de . Por outro lado, se é o conjunto dos inteiros pares então não tem mínimo.
Exemplo: O elemento de , com a relação de inclusão, é mínimo
Exemplo: Exemplo da diferença entre um elemento maximal e um elemento máximo: considere o conjunto de todos os subconjuntos de com no máximo três elementos e ordenados por inclusão . Então é um elemento maximal de pois ninguém de o contém e não é máximo porque não contém o elemento de .
Exercício 27 Determine os elementos maximais/minimais/máximo/mínimo em .
Exercício 28 Prove que se tem máximo então ele é único.
Exercício 29 Prove que todo elemento máximo de uma ordem é maximal.
Boa ordem
é boa ordem se é uma ordem total e todo subconjunto não vazio de tem mínimo. A propriedade útil da Boa-ordem é que ela permite provas por indução, como nos naturais.
Notação: significa e .
Teorema 36 (Princípio da Indução para conjuntos bem-ordenados) Seja bem-ordenado e um predicado sobre . Se para todo
verdadeiro para todo com implica que é verdadeiro
então é verdadeiro para todo .
Em resumo
Demonstração: A prova é por contradição. Sejam uma boa ordem e um predicado sobre .
Suponha que que para todo vale que
e assuma que existe tal que não é verdadeiro.
Defina
que, por hipótese é não vazio. Seja o menor elemento de com respeito a ordem . Então, para todo vale . Por (36), é verdadeiro, uma contradição.
Exercicio Considere a relação sobre o conjunto dos inteiros negativos definida por
se, e somente se, .
- Prove que é uma relação de ordem sobre .
- Prove que é uma boa-ordem sobre .
- Seja dada por e para , .
Use o Princípio de Indução para conjuntos bem-ordenados em para provar que
Na axiomática de ZFC para a teoria dos conjuntos o seguinte resultado é equivalente ao axioma da escolha.
Teorema 37 Para todo conjunto não vazio, existe uma ordem total tal que é boa-ordem.